Kim Yo-jong foi durante algum tempo figura importante no governo, mas agora há rumores de que estaria sem prestígio
Na quase sempre secreta Coreia do Norte patriarcal, uma figura feminina enigmática tem causado curiosidade nos serviços de inteligência dos Estados Unidos e da Coreia do Sul nos últimos anos: Kim Yo-jong, irmã do ditador Kim Jong-un.
Chamada pelo pai, o ex-ditador Kim Jong-il, de "minha doce princesa", segundo o livro "A Irmã: a extraordinária história de Kim Yo-jong, a mulher mais poderosa da Coreia do Norte" (em tradução livre), de Sung-Yoon Lee, Kim Yo-jong, hoje com 36 anos, conquistou um espaço importante no governo do irmão, contrastando com velhos militares que sempre cercaram a dinastia.
Agora, porém, há rumores de que a dedicada irmã poderia ter caído em desgraça no castelo de cartas norte-coreano.
Ela é a filha mais nova conhecida de Kim Jong-il e da mulher dele, Ko Yong-hui. Foi criada da mesma forma que os dois irmãos, tendo frequentado um internato em Berna, na Suíça, durante o ensino primário.
Formou-se em ciências da computação na Universidade Kim Il-sung, em 2007, ano em que foi nomeada como membro júnior do Partido dos Trabalhadores da Coreia.
Durante muitos anos, pouco se sabia sobre a existência dela — a Doce Princesa foi vista publicamente pela primeira vez no funeral do pai, em 2011.
Kim Yo-jong ganhou holofotes mundiais em 2018, ao se tornar o primeiro membro da dinastia a fazer uma visita oficial à Coreia do Sul, durante os Jogos Olímpicos de Inverno em PyeongChang. Ela se reuniu com o então presidente sul-coreano, Moon Jae-in, e apareceu em fotos ao lado do ex-vice-presidente dos EUA, Mike Pence, e do ex-primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe.
Posteriormente, participou de encontros, ao lado de seu irmão, com o presidente chinês, Xi Jinping, e com o então presidente dos EUA, Donald Trump.
Oficiais das inteligências americana e sul-coreana têm muita dificuldade em entender os papéis e o momento político de Kim Yo-jong no governo da Coreia do Norte.
Sabe-se, por exemplo, que ela foi removida do Politburo — principal órgão decisório do Partido dos Trabalhadores da Coreia — em 2019, com o fracasso das negociações com a gestão Trump, em um indicativo de perda de poder interno.
Acabou readmitida no mês seguinte e, em agosto de 2020, a imprensa americana relatou, citando agentes de inteligência sul-coreanos, que a Doce Princesa havia conquistado um controle significativo da política estatal.
Naquele mesmo ano, a revista americana Time publicou uma reportagem intitulada "Dinheiro, iates e conhaque: as ligações de Kim Yo-jong com o escritório secreto que mantém as elites da Coreia do Norte no luxo".
A irmã de Kim jong-un teria controle dos Escritórios 38 e 39, sediados no Partido dos Trabalhadores da Coreia.
O primeiro seria responsável por cuidar das finanças pessoais da família Kim, enquanto o segundo foi designado pelo Departamento do Tesouro dos Estados Unidos como sendo "um ramo secreto do governo da República Popular Democrática da Coreia [Coreia do Norte] que fornece apoio crítico à liderança norte-coreana, em parte, por meio do envolvimento em atividades econômicas ilícitas, da gestão de fundos secretos e da geração de receitas para a liderança".
A Coreia do Norte é conhecida por abastecer o regime com dinheiro de crimes cibernéticos, por exemplo.
Os papéis da mulher mais importante do regime, porém, vão além da simples gestão de recursos. Como chefe do Departamento de Propaganda e Agitação do Partido dos Trabalhadores, ela passou a cuidar diretamente das mensagens ideológicas do governo na mídia, nas artes e na cultura em geral.
Segundo o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, essa "é a principal agência da Coreia do Norte responsável pela censura de jornais e transmissões, entre outras coisas".
O primeiro comentário público atribuído diretamente a Yo-jong teve um tom considerado beligerante. Em 2020, após o Sul condenar um exercício militar de fogo real de Pyongyang, o governo dos Kim emitiu um comunicado em que chama o vizinho de um "cachorro assustado latindo".
Muitos analistas interpretaram a mensagem como uma tentativa de demonstrar estabilidade e união da família em seu discurso.
Filha entra na linha de sucessão
Irmã de Kim Jong-un chegou a ser apontada como
uma possível sucessora dele 27 de abril de 2018 | KOREA SUMMIT PRESS POOL/POOL VIA REUTERS |
Entretanto, o protagonismo de Kim Yo-jong pode ser a própria corda que a enforcará, caso represente uma ameaça ao poder do irmão.
O tabloide britânico Express publicou uma reportagem, em fevereiro deste ano, em que afirma que Yo-jong está supostamente sendo afastada dos holofotes em favor da geração mais jovem, no caso, a filha do ditador, Kim Ju-ae, possível sucessora do pai.
"Dado o histórico de Kim Jong-un de eliminar seus rivais políticos, especialistas expressaram preocupações sobre a segurança de sua irmã, especialmente porque ela caiu em desgraça", diz a publicação.
O aumento do protagonismo de Kim Ju-ae, "a mais amada", seria um demonstrativo de que não há mais espaço para a Doce Princesa no poder, segundo fontes ouvidas pelo jornal.
A codiretora do Instituto Internacional de Estudos Coreanos, na Universidade Central de Lancashire, no Reino Unido, Sojin Lim, também relembrou os assassinatos de parentes próximos de Kim Jong-un em um artigo no site The Conversation.
"Esta é uma família em que muitos dos possíveis concorrentes masculinos ao poder foram eliminados, incluindo Kim Jong-nam, meio-irmão de Kim Jong-un, que foi assassinado com o agente nervoso VX no aeroporto de Kuala Lumpur, na Malásia, em 2017; e seu tio, Jang Song-thaek, que foi supostamente executado por um pelotão de fuzilamento em 2013, após ser acusado de ser contrarrevolucionário. Portanto, o status do relacionamento de Kim Yo-jong com seu irmão é tão escrutinado quanto a saúde física de Kim Jong-un quando se trata de saber se — e quando — ela pode estar em posição de desafiar o poder supremo na Coreia do Norte."
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